O diálogo acima resume bem o que está acontecendo em torno de um grupo cada vez mais numeroso de jovens brasileiros que são seguidos por uma infinidade de fãs, ganham (bom) dinheiro executando performances que abordam temas como música/humor/gastronomia/comportamento e que distribuem conteúdo por meio de plataformas de vídeo.
Um dos mais conhecidos comediantes do país, Rafinha Bastos foi uma espécie de mestre de cerimônias da primeira edição brasileira de uma Youtube Fanfest, ocorrida no Audio Club, em São Paulo, em 5 de novembro. Já Gabi Luthai é uma mineira de Araxá que tem 22 anos e mais de 1,1 milhão de seguidores de seu canal no YouTube (a página no Facebook foi curtida por mais de 2,8 milhões).
Antes da conversa com Rafinha, Gabi Luthai se apresentou no palco da Fanfest, por onde passaram ainda dezenas de outros youtubers. Depois de ver a performance ao vivo, a impressão que ficou é: como uma jovem que canta música romântica meio careta consegue arrastar para si centenas de milhares de fãs que, neste século 21, têm o poder de, com alguns cliques, se conectar com qualquer artista do planeta? Por que escolhem Gabi Luthai? A resposta está na conversa com Rafinha Bastos.
Gabi Luthai: Tenho o meu canal (no YouTube) há cinco anos, desde 2010, sou “velha”.
Rafinha Bastos: Mas por que você demorou para bombar?
Gabi Luthai: Eu era muito tímida, parecia um pau tocando, não tinha um diferencial. Mas então comecei a cantar outros tipos de música e a interagir com a câmera. E aí a galera começou a gostar.
Neste mundo do entretenimento digital, em que uma curitibana de 22 anos chamada Kéfera Buchmann chega a ter quase 10 milhões de seguidores no YouTube e que é capaz de causar um pequeno tumulto na Bienal do Livro do Rio, o talento artístico (essa coisa tão subjetiva, como prova a minha decepção com a música de Gabi Luthai) é apenas parte de uma receita que tem como ingredientes principais: 1) falar a língua do fã; 2) se comportar como os fãs.
Praticamente sem exceção, todos os youtubers bem-sucedidos não ligam se a produção de seus vídeos é meio tosca, se cometem algum erro, se o áudio tem defeitos, se tropeçam no português – pelo contrário: quanto mais coloquial, melhor. Gírias e palavrões? Sem problema. E em encontros e eventos em que têm contato “real” com os fãs, não se escondem em salas VIP – se misturam aos fãs, trocam ideias.
É o que está na essência de gente como Cauê Moura, que descreve seu canal no YouTube como “vídeos que ofendem a família brasileira” e que tem debaixo de seu guarda-chuva mais de 3,8 milhões de seguidores (e 306 milhões de visualizações), números impressionantes que o incentivaram a abrir uma loja (online, claro) que vende camisetas, bermudas, bonés e capas para celular.
Gente como Caué Moura e Mussoumano (outro que faz rap zoeira e se apresentou na Fanfest), ou como PC Siqueira e Otávio Albuquerque (Rolê Gourmet), que no palco da Fanfest ensinaram a preparar um sanduíche americano, revelam outro componente que está no DNA dos principais youtubers brasileiros: o humor. Para eles, a seriedade não está com nada. O negócio é tirar sarro.
E esse “digital way of life”, coloquial, bem humorado, está se disseminando para além de seu habitat. Não é à toa que William Bonner, no “Jornal Nacional”, recentemente passou a chamar cidades como Belo Horizonte e Florianópolis por “Beagá” e “Floripa”. Bonner teve no ar um diálogo revelador com a apresentadora do tempo do “JN”, Maria Júlia:
William Bonner: Para terminar, o que você prefere: ser chamada de Maria Júlia ou de Maju, como você se intitula nas redes sociais e o teu público, os seus fãs, ficam pedindo para nós?
Maria Júlia: Eu prefiro Maju
William Bonner: Renata (Vasconcellos), a partir de hoje, Maria Júlia passa a ser Maju.